Hahnemann preparava seus próprios medicamentos, pois não
dispunha de farmacêuticos de sua confiança, e que com ele participassem do
estudo da homeopatia e o desenvolvimento dos novos medicamentos, que eram tão
diferente dos da época, bastante agressivos e tóxicos. Hoje a situação é outra,
e são os farmacêuticos homeopatas os responsáveis pelo preparo dos medicamentos
homeopáticos e a dispensação das prescrições.
Mas, voltando a Hahnemann, é interessante notar que ele
diluiu os medicamentos para diminuir sua ação primária, e muitas vezes até
mesmo sua toxicidade. Em seguida, passou a agitá-los, percebendo que sua ação
aumentava. Assim criou uma farmacotécnica própria, com seus medicamentos
dinamizados. Uma importante consequencia que a diluição traz é a ausência de
matéria, a impossibilidade de comprovar a presença de princípios ativos e a
dificuldade para explicar o mecanismo de ação dos medicamentos, constituindo-se
em um ponto frágil para aceitação desta terapêutica.
De qualquer forma, sabemos que a homeopatia foi sendo
divulgada para outros países, já na época em que Hahnemann vivia. Era
necessário produzir medicamentos. Surgiram as primeiras farmacopéias
homeopáticas. Korsakov, um militar e proprietário de terras na Rússia, para
contornar dificuldades para dinamizar medicamentos durante campanhas do
exército, propôs um método diferente, mais prático, pois utilizava apenas um
frasco para o preparo de qualquer diluição. Korsakov foi também o responsável
pelo conceito de “estojos” de medicamentos, que possibilitavam a prática
homeopática com o próprio homeopata fornecendo o medicamento ao paciente.
Também já naquela época, e seguindo as idéias da revolução
industrial, outros homeopatas, procurando diminuir o trabalho manual,
apresentaram máquinas que poderiam substituir o agitação manual. Farmacêuticos
e homeopatas com espírito empresarial começaram a se ocupar da produção de
medicamentos nos diversos países.
No Brasil, a homeopatia chegou trazida pelo francês Benoit
Mure, que também dispunha de sua botica de medicamentos. Sabe-se que durante
uma época, os medicamentos eram importados prontos da Europa e só revendidos
aqui. Ou então, as dinamizações chegavam prontas e só eram veiculadas e
dispensadas por farmacêuticos brasileiros. Na segunda metade do século passado
foram aparecendo farmácias nas principais cidades brasileiras, fundadas por
homeopatas. Eram locais de venda de medicamentos, geralmente compostos (os
chamados “complexos homeopáticos”), onde havia indicação no balcão, realizada
por farmacêuticos ou leigos com longa prática em homeopatia, assim como
dispensários, nos quais médicos e homeopatas leigos experientes consultavam
seus pacientes. Assim sirgiram as farmácias Murtinho Nobre, Alberto Seabra,
Homeoterápico, Almeida Prado, Jade (do farmacêutico Jader de Almeida Cardoso,
descendente de família de homeopatas que também tinham farmácias no Rio de
Janeiro e Recife). As dinamizações frequentes eram as baixas potências, tomadas
em doses repetidas, alternadas ou misturadas.
A partir da década de 80, alguns fatores alteraram este
panorama. O médico argentino Eyzayaga foi convidado pela APH para ministrar
cursos em São Paulo. Seguidor de Kent, estimulou a prescrição de medicamentos
dinamizados até potências mais altas e que requisitavam diferente métodos,
mecânicos, para sua obtenção. Também Galvão Nogueira, médico que fundou o grupo
Benoit Mure, preocupado com detalhes da qualidade da dinamização, iniciou a
farmácia Bento Mure, na qual só se usava métodos manuais. Foi também o
responsável por trazer as potências LM (cinquenta milesimais) para nosso país,
a partir do México. Médicos ligados a estes grupos necessitavam de medicamentos
para seus pacientes e incentivaram a fundação de novas farmácias, como a HN.
Outras surgiram de iniciativas de farmacêuticos, como a Cristal, Albion,
Cristiano, Sensitiva, Alquimista, etc. Nas outras capitais, o mesmo fenômeno se
repetia.
A popularidade da homeopatia começou a crescer, e os
farmacêuticos, percebendo que era um mercado de trabalho atraente, voltaram a
exercer sua atividade na produção e dispensação dos medicamentos. Voltaram a
estar presentes nas farmácias, o que foi notado pela população, que passou a
diferenciar farmácias de drogarias. Farmácias homeopáticas passaram a ser um
local para divulgação de informações sobre homeopatia, alimentação natural,
práticas alternativas, saúde em geral. Além de fonte de renda, o farmacêutico
percebeu que seu prestígio aumentou, assim como sua satisfação com a prática
original de sua profissão.
Mas a legislação para a área farmacêutica homeopática era
inexistente ou estava desatualizada. Com o aumento do número de farmácias, era
necessário padronizar as técnicas de preparo dos medicamentos. Assim surgiu a
necessidade de redigir um Manual de Normas Técnicas. Algumas associações
farmacêuticas homeopáticas estaduais já existiam, como a APFH, em São Paulo.
Mas, para fazer mais, era necessária uma associação nacional. No Congresso
Brasileiro de Homeopatia de 1988, em Gramado, foram instituídos os Encontros
Nacionais de Farmacêuticos Homeopatas. No II Encontro, realizado em São Paulo,
em 1990, foi finalmente criada a ABFH, Associação Brasileira de Farmacêuticos
Homeopatas. Os Encontros se transformaram em Congressos Brasileiros de Farmácia
Homeopática (o primeiro em São Pedro, SP, em 1997; o segundo no Rio de Janeiro
em 1999 e o terceiro em Florianópolis, em 2001). Durante os Encontros, e
posteriormente os Congressos, foi elaborado o Manual de Normas Técnicas para a
Farmácia Homeopática e a Súmula para os Clínicos, bem como o Manual do
Consumidor de Medicamentos Homeopáticos. É importante notar que todos os
trabalhos para elaboração dos textos são abertos à participação de qualquer
associado e a aprovação final dos textos é feita em assambléia.
Em relação à formação do farmacêutico em homeopatia, a
Comissão de Ensino da ABFH tem trabalhado, através de Foruns, no
estabelecimento de recomendações para cursos de graduação e pós graduação “latu
sensu”.
O Conselho Federal de Farmácia estabeleceu resolução sobre o
farmacêutico responsável técnico em farmácia homeopática, assim como de
especialista, e reconhece cursos, após apreciação de sua documentação.
A Comissão de Título de Especialista da ABFH oferece
periodicamente a Prova de Título de Especialista, para aqueles farmacêuticos
que desejam ser reconhecidos como tal.
O número de farmacêuticos com formação em homeopatia no país
é bastante grande, já que há cursos em diversas regiões do país.
Há alguns anos o medicamento era preparado em farmácias
classificadas como “homeopáticas”. Fora dos grandes centros, a dificuldade em
manter uma farmácia manipulando apenas medicamentos homeopáticos, fez com que
as chamadas “farmácias únicas” se instituissem, isto é, aquelas que manipulam e
comercializam qualquer tipo de medicamento. A exigência é que, para preparar
medicamentos homeopáticos, a farmácia disponho de laboratório próprio e
separado dos demais, e que o farmacêutico possua formação reconhecida em
homeopatia. Assim, a produção do medicamento ocorre em farmácias localizadas no
país inteiro, que adquirem tinturas-mãe ou matrizes dinamizadas de laboratórios
industriais nacionais ou estrangeiros. A partir daí, dinamizam, se necessário,
e dispensam as prescrições de médicos, dentistas e veterinários homeopatas.
Em outros países, a produção dos medicamentos está
concentrada em laboratórios industriais, que fornecem medicamentos já prontos
para atendimento dos pacientes. Farmacêuticos trabalham em indústrias ou apenas
revendem medicamentos homeopáticos, como ocorre em relação aos remédios
alopáticos, nas drogarias de nosso país.
No modelo brasileiro, o atendimento das prescrições pode ser
mais individualizado, além de ter tido o mérito de ter trazido o farmacêutico
de volta para o atendimento da população nas farmácias.
O reconhecimento do bom trabalho realizado pelos
farmacêuticos no Brasil pode ser visto pelo respeito que a classe recebe nos
meios farmacêuticos, pelo crescimento da participação nas decisões técnicas e
legislativas dos órgãos sanitários oficiais, e também pela atuação na
Secretariad e Farmácia da Liga Médica Homeopática Internacional, que, pela
quarta vez consecutiva é ocupada por farmacêutico brasileiro.
Escrito por Francisco
Sollero.